Todo mundo conhece aquela fábula clássica chamada ” A roupa nova do rei”, do Hans Christian Andersen.
Basicamente, a história trata de dois caras espertos que vendem uma roupa ao rei feita de um tecido tão sofisticado que “Só quem é inteligente pode ver”. O Rei que era burro acreditou e segue-se a fábula com um rei desfilando pelado com uma roupa que todos diziam estar vendo. E todos do reino pensando que enganavam uns aos outros de que não eram burros.
A vida, meus amigos tem uma séria tendência a humilhar as mais fantasiosas obras da imaginação humana. Veja só este caso:
O museu da arte não visível ou MONA ( Museum on Non-Visible Art), “exibe” aos seus visitantes uma série de trabalhos que só podem ser admirados quando o visitante lê o que o artista escreveu sobre sua obra. Então é como ir a um lugar cheio de espaço vazio e com plaquinhas onde se diz: Esta é uma escultura assim, assado que diz isso e evoca aquilo e tal. E cabe ao visitante, imaginar o que o artista pensou. A obra de arte é criada na mente do visitante, exatamente como a roupa nova do rei.
Obviamente que qualquer pessoa com um mínimo de capacidade intelectual riria desta ideia estranha, mas o que você diria se eu te contasse que algumas pessoas gostam tanto da imagem que suas mentes produziram que COMPRAM as obras INVISÍVEIS, pagando em dinheiro bem visível?
Foi o que aconteceu com uma senhora abastada o suficiente para “investir na obra de arte” a cifra de U$ 10.000,00, ao qual chamou de “masterpiece”.
O museu de arte invisível foi criado por um ator chamado James Franco, que visava levar a arte conceitual a um novo nível. Há um site oficial aqui e um video explicativo aqui, mas você nao verá nada além do que eu já te contei sobre um museu cheio de ar onde o visitante imagina as obras a partir das descrições criadas pelos “artistas”.
Se até aqui a coisa já está Gump o suficiente pra você, espere até saber que para evitar as fraudes ou pirataria das obras, o comprador adquire um certificado de autenticidade que lhe confere a propriedade inalienável sobre a criação, mesmo ela sendo invisível. Para que seus amigos e visitantes possam desfrutar do prazer de contemplar sua obra de arte, você deve colocar o cartão com a descrição da obra na parede ao lado do quadro, que se resume a uma moldura sem nada dentro.
A pessoa que comprou o quadro invisível é Aimee Davidson, uma “produtora de novas mídias”. Nesta entrevista, ela explica por que investir dez mil doletas num quadro em que somente ela pode ver:
Como produtora de novas mídias, me identifiquei com a ideologia do projeto e fui particularmente inspirada na frase “Nós trocamos idéias e sonhos como moeda na Nova Economia”.
Os meios de comunicação social, que são parte integrante da ”Nova Economia” da Internet, pós Web 2.0, revolucionou o modo como artistas criam, promovem e vendem as suas obras de arte. Senti que o ato de comprar “ar fresco” apoiou a minha tese sobre um conceito que denomino de “você-commerce”, que é o marketing e a monetização da própria persona, habilidades e produtos através do uso das mídias sociais e das plataformas de auto-difusão, como o uso da plataforma de financiamento público para financiar o Museu de Arte Não-Visível. Basicamente, eu queria colocar meu dinheiro onde minha boca está.
Realmente, isso é algo que nos leva a pensar até que ponto temos o direito de chamar esta mulher de estúpida. Veja, por exemplo, a arte contemporânea de hoje. Temos verdadeiras marmotas sendo vendidas por valores exorbitantes. Grande parte dessas supostas “obras de arte” poderiam ser questionadas no que tange a sua finalidade. Um exemplo que posso citar é o artista que vende (caro) seu próprio excremento em latinhas assinadas.
E as pessoas compram!
O fato, meus amigos, é que estamos todos na era do rei nu. Nós confiamos cegamente no dinheiro, mas o que é o dinheiro, senão um pedaço de papel pintado que dizem pra nós que tem valor?
Antigamente, quando o lastro das economias se baseava em algo tangível como o ouro, isso até poderia ser verdade. Mas hoje? Todo mundo sabe que o papel pintado que gira por aí, trocando de mão em mão, não tem lastro real. É tudo uma coisa que todo mundo combinou de acreditar. Qual a diferença disso para uma roupa que só os inteligentes podem ver? Ou um quadro que você tem que imaginar?
Hoje, o próprio papel pintado começa a acabar, e vai sendo lentamente substituído por uma versão ainda mais metafísica. Hoje, grande parte do dinheiro que circula no planeta se dá em forma de créditos. Um cara paga o outro entrando num site e mandando “créditos” para o outro banco. Então, só mudam os números numa tela. Esses pequenos números dizem se você é rico ou pobre. Se tem poder ou não.
Hoje, no Brasil, são números invisíveis somados de maquinas de voto que nos dizem quem irá governar. Os lastros da realidade se esvanecem com o tempo e nossa cultura assumiu de vez a virtualidade. O substrato de papel está sumindo rapidamente. Pensando por este lado, talvez Aimee Davidson simplesmente tenha trocado nada por “ar fresco”.
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