Em 1943 uma irritante (para os nazistas) ponte-aérea estava plena atividade: Entre a neutra Suécia e a Inglaterra uma série de De Havilland Mosquitos como o da foto transportavam cargas de rolamentos de precisão para a Inglaterra.
Adaptado de seu propósito original de caça-bombardeiro, entre as diversas variações estava a de carga, que mantinha as características revolucionárias da aeronave, voando alto e rápido demais para ser interceptado pela Luftwaffe. Só que dessa vez o Mosquito voava baixo. Arriscado, mas uma decisão do piloto que pode ter mudado o destino da Guerra.
O Mosquito estava adaptado para levar no compartimento de bombas um passageiro. Com pára-quedas, máscara de oxigênio e uma lâmpada de leitura, um sujeito poderia viajar –deitado- se fosse caso de extrema necessidade. Era, mas o passageiro VIP, a Carga Preciosa (como aprendemos nos videogames) não respondia ao contato pelo sistema de rádio interno.
Temendo o pior, o piloto nivelou muito abaixo dos 8.839m de altitude máxima atingida pelo Mosquito, confiando que voar baixo a 610Km/h seria suficiente para evadir os alemães. Para sorte do mundo e do físico Niels Bohr, foi.
No compartimento de bombas Bohr dormia feito um bebê, depois de ter apagado pela falta de Oxigênio –não colocou a máscara direito- e nem percebeu que quase morreu. Talvez tenha até sonhado com dois grandes frascos abandonados em seu antigo laboratório em Copenhague.
1940
Antes de Pearl Harbour, quando para boa parte do mundo a 2a Guerra era um problema distante a Europa já literalmente pegava fogo. A perseguição aos judeus e outros indesejáveis corria solta na Alemanha. A medida que países eram anexados no trágico jogo de War do Tio Adolph aumentava o jogo de gato e rato, com gente fugindo em busca de asilo.
Na Dinamarca Niels Bohr, ganhador do Prêmio Nobel da Física de 1922 e um dos papas da Teoria Quântica militava abertamente em prol dos cientistas judeus alemães, conseguindo trazer um monte deles para a segurança relativa do país, de forma Legal ou não.
Só que Hitler também anexou a Dinamarca, e Bohr tinha um problema. Na verdade vários. Ser um cientista de renome mundial concedia certa imunidade, mas o fato de ser filho de mãe judia (o pai cristão seria devidamente esquecido pela Gestapo) não pegaria bem, nem seu apoio a dissidentes e fugitivos do Reich.
Também não ajudaria em NADA o fato de que ele estava de posse de duas medalhas do Prêmio Nobel, pertencentes ao oposicionista Max von Laue e ao judeu James Franck, alemães vendedores do prêmio de Fìsica de 1914 e 1925, respectivamente.
Uma Ordem Geral tornara crime punido com morte tirar da Alemanha qualquer quantidade significativa de Ouro, e ele estava de posse de duas medalhas com 175 gramas de Ouro 23 quilates, com os NOMES dos cientistas laureados. Cada uma HOJE vale só pelo peso em Ouro US$9 mil.
Elas haviam sido enviadas para Bohr justamente para evitar que caíssem em mãos nazistas, mas as tropas da SS marchavam pela cidade. Ele seria preso, executado e para piorar as medalhas seriam derretidas e usadas para comprar bombas ou coisa que o valha.
“Eu preciso dissolver essas medalhas”
A idéia de enterrar ou esconder as medalhas foi rapidamente descartada. Os nazistas iriam vasculhar tudo em busca de material comprometedor. A saída veio da mente de Georgy de Hevesy, um grande químico húngaro que trabalhava no laboratório de Bohr, e viria a ganhar o Nobel em 1943 por seu trabalho com marcadores radioativos.
Ouro é um dos metais mais estáveis, não reage à maioria dos ácidos, não é solúvel em quase nada, por isso era usado em amálgamas dentárias e implantes. Só que há uma substância em especial capaz de realizar a proeza: Água Régia, uma mistura de uma parte de ácido nítrico com três partes de ácido clorídrico.
É uma reação lenta, ainda mais com medalhas de 175g, mas os dois conseguiram terminar antes da chegada das tropas, e no lugar de dois blocos comprometedores de Ouro, terminaram com um par de grandes frascos repletos de um líquido corrosivo, mal-cheiroso e laranja-escuro, quase marrom.
A reação forma Cloreto de Ouro, AuCl3 uma substância hidrossolúvel que não se parece nada com Ouro.
Colocados em uma prateleira, os frascos não-marcados foram deixados de lado, enquanto Bohr sobrevivia a entrevistas com a Gestapo, prosseguia em suas atividades subversivas em prol dos fugitivos do Reich e aguentava até 1o de Outubro de 1943, quando Hitler ordenou que todos os judeus da Dinamarca fossem presos e deportados. Com ajuda da resistência mais de 8000 fugiram para a Suécia, inclusive Bohr.
Lá, contatado pela Inteligência Britânica aceitou trabalhar no projeto nuclear inglês, quando embarcou no Mosquito para Londres, em sua quase desastrosa viagem.
Logo depois ele foi transferido para o Projeto Manhattan em Los Alamos, onde foi peça fundamental.
Depois do Dia D Bohr voltou para Copenhague, para encontrar uma universidade depredada e saqueada, com muito de valor destruído ou roubado, mas para surpresa dele e de Georgy de Hevesy no armário, ainda intactos estavam os frascos com o Cloreto de Ouro.
“Na Natureza nada se perde”
A simples adição de água oxigenada bastou para fazer com que o Ouro se precipitasse. Recolhido foi enviado para a Comissão Nobel, em Estocolmo, onde novas medalhas foram cunhadas e em uma cerimônia em 1950 devolvidas aos dois cientistas.
Por 5 anos os nazistas procuraram as medalhas do Prêmio Nobel de um físico judeu e outro oposicionista ao Reich, mas a falta de conhecimento científico os tornou incapazes de perceber que elas estavam debaixo de seus narizes.
O Conhecimento venceu o medo e o terror, a força bruta ficou impotente diante da Inteligência. Para todos os soldados frustrados que revistaram os laboratórios incontáveis vezes foi como se uma capa de invisibilidade tivesse sido jogada sobre as medalhas. Em parte é verdadeiro, afinal como disse Sir Arthur Clarke, “toda tecnologia suficientemente avançada é indistinguível de magia”.
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