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domingo, janeiro 8

Um absurdo manter presa uma pessoa gravemente enferma












A
discussão sobre o cárcere brasileiro é apaixonante, inquestionavelmente! Há anos, o nosso sistema penitenciário está em colapso, falido, dado o tratamento cruel e desumano que é dispensado ao condenado no país. Em que pese essa situação, ainda depõe contra todos nós o fato de que hoje muitos detentos do país sofrem penalidades duplas: da prisão em si e da penalidade da doença, às vezes incurável, que muitos detentos adquirem no xadrez, tais como aids, câncer, hepatite, lepra... Um descaso inominável!

Há dezessete anos atrás, criou-se no país o instituto jurídico da execução da pena. Em tese, o instituto tem uma conotação de modernidade, mas na prática deixa muito a desejar. Está previsto na lei, por exemplo, que o condenado acometido de doença grave mereça o cumprimento da pena em regime de prisão domiciliar. E, se for o caso, trata-se em liberdade. Se isso ocorre, deve ser em casos esporádicos, sequer noticiados, conforme denunciam renomados juristas brasileiros.

Para o riograndense Aury Celso Lima, professor e doutor em Direito pela Universidad Complutense de Madrid, "é um absurdo manter presa uma pessoa gravemente enferma, com o objetivo constitucional de reinsertá-la, se unicamente será excarcelada dias antes de morrer. Não se trata aqui de filosofar sobre a dureza das penas privativas de liberdade, senão de constatar que uma pena, em princípio não reputada de desumana, pode-se tornar como tal, se é acrescentada uma pena à pena, isto é: o efeito cumulativo de ambos sofrimentos (da privação da liberdade e da enfermidade grave e incurável)".

Comungo desse sentimento de indignidade da elite doutrinária do país, com a qual a sociedade deve se filiar. É da boa técnica jurídica - aplicando-se até mesmo o Direito comparado - que os presos com enfermidades incuráveis devam ser soltos imediatamente ou tenham prisão domiciliar, quando diagnosticada a doença, para que vivam com seus familiares o resto dos seus dias, pois o prolongamento do cativeiro colide frontalmente com um dos princípios basilares do Direito Penal: que é a reinserção social do detento.

Citando mais uma vez o professor Aury Celso, "ante esse quadro, uma sentença da Audiência Provincial de Madrid, Espanha, tratou de forma louvável o tema. Frise-se, desde logo, que tal exemplo oferecido pelo Direito comparado não só pode, como seria aconselhável que motivasse nossos juizes das varas das execuções penais para que caminhassem no mesmo sentido".

A magistratura espanhola bate justamente no ponto nevrálgico do problema, reconhecendo que estamos vivendo um "vergonhoso panorama", de contornos até mesmo universal. É inconcebível que nossos magistrados ainda insistam em adotar a frieza da lei para manter essa situação. Esquecem, por exemplo, que na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum, na forma preconizada pelo artigo 5º, da Lei de Introdução ao Código Civil, legislação aplicável subsidiariamente a casos da esfera criminal.

É desumano - e socialmente inaceitável - que um juiz, a título de está cumprindo a letra da lei, não reconheça ao preso doente esse benefício, que pode ser a prisão domiciliar e até mesmo a sua liberdade definitiva. Negar-se tal benefício seria, como afirmamos, aplicar ao detento uma condenação dupla. E, como tal, poderíamos até admitir, frente ao instituto da sociologia criminal, que estamos diante de um flagrante tipo de "homicídio oficial", dado o descaso com que é tratado tão relevante tema na esfera penal.

O caos que está instalado no sistema carcerário e a gravidade da situação de alguns presos exige uma mudança de mentalidade, para que o cínico apego à letra fria da lei dê lugar a um tratamento humano e responsável. É o que aconselham aqueles que pensam o Direito Penal inserido no contexto social.

por Miguel Dias Pinheiro
advogado e procurador

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